Responsável por desatar a onda de protestos que tomou
o país, em junho, o Movimento Passe Livre (MPL) convocou uma
manifestação contra a má qualidade dos transportes ferroviários em São
Paulo.
A concentração está marcada para as 15h no
Vale do Anhangabaú, centro da capital. A nova marcha foi motivada pelas
recentes denúncias de formação de cartel entre empresas estrangeiras
que, com anuência do governo do estado, há duas décadas dominado pelo
PSDB, teriam burlado a concorrência para vencer licitações de reforma de
composições e ampliação das linhas do Metrô e da Companhia Paulista de
Trens Metropolitanos (CPTM).
“Temos usado muito o
Facebook para divulgar, além de acompanhar os metroviários em
panfletagens nas principais estações da cidade. Vai ser um ato
importante, mas, de maneira geral, nosso foco, desde que revogamos o
aumento, é estar voltados para as ações da periferia, que é um terreno
importante de luta”, explica Mayara Vivian, membro do MPL, para quem o
protesto de quarta-feira será mais um episódio na busca pela qualidade
do transporte público em São Paulo.
“Como temos
dito desde o início, é essencial que haja solidariedade entre diversos
setores da sociedade que lutam contra a lógica do capitalismo em todas
as áreas, contra o privilégio que é dado ao dinheiro e às empresas em
vez de ser dado às pessoas.”
A manifestação do
Passe Livre contará com apoio do Sindicato dos Metroviários de São
Paulo, Sindicato dos Ferroviários da Zona Sorocabana e da Central Única
dos Trabalhadores (CUT), que estão mobilizando suas bases.
“Os
contratos irregulares atingem não só a venda de produtos, mas reforma e
manutenção dos trens. Queremos a devolução do dinheiro roubado da
população e que prendam e punam exemplarmente corruptos e corruptores”,
propõe Altino de Melo Prazeres Júnior, presidente do Sindicato dos
Metroviários.
O sindicalista acredita que a
manifestação também servirá para denunciar o esquema de parcerias
público-privadas (PPP) em São Paulo. “Essas denúncias do cartel são uma
demonstração clara do que é a PPP: uma parceria em que o público é
corrompido pelo setor privado.”
Prioridades
Coadunado
com o discurso do Passe Livre, Prazeres defende que o governo priorize o
direito dos cidadãos a um transporte digno – e não o lucro de grandes
empresas – na hora de definir políticas públicas para o setor.
Isso
inclui a reestatização da Linha 4-Amarela do Metrô paulista, por
exemplo, trecho operado por um consórcio privado. “No fundo, tudo é uma
disputa pelo dinheiro do Estado: os empresários querem ficar com os
recursos, e os trabalhadores, conscientes ou não, querem que o fruto do
nosso trabalho fique para a maioria”, explica, ressaltando que, se o
Erário fosse ressarcido do prejuízo que teve nos processos licitatórios –
superior a R$ 400 milhões, segundo denúncias da Siemens –, mais linhas
poderiam ser construídas e o preço da passagem, baixar.
“Quando
brigam pelo valor da tarifa, as pessoas querem que os empresários
ganhem menos dinheiro e a população gaste menos”, diz Prazeres.
O
presidente da CUT em São Paulo, Adi dos Santos Lima, adiciona ainda
outra motivação para os protestos do dia 14: o grande risco de que a
Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) proposta pela bancada do PT na
Assembleia Legislativa acabe, como tantas outras, sendo engavetada pelos
apoiadores do governador Geraldo Alckmin.
Os
petistas conseguiram até agora 26 assinaturas – para dar início à
investigação, precisam de 32, além de aprovar uma mudança regimental que
permita o funcionamento simultâneo de uma sexta CPI na Casa. Para
tanto, precisam de outras 48 adesões.
“Os
trabalhadores querem uma ampla investigação sobre as denúncias
levantadas contra desvios de verbas públicas e conluios no governo de
São Paulo”, argumenta Adi, que vê com entusiasmo o retorno das
manifestações na capital. “Sair pras ruas apenas para cobrar redução de
tarifa de ônibus é muito pouco. Merecemos mais transparência no trato da
coisa pública, transporte de qualidade, segurança pública.”
Além
de pedirem investigação das denúncias e tarifas mais acessíveis ao
bolso dos paulistanos, os ferroviários da Zona Sorocabana, sindicato que
representa os trabalhadores das linhas 8 e 9 da CPTM, levarão para o
Vale do Anhangabaú sua contrariedade em relação à política de
terceirização da empresa.
“A qualidade do
transporte começa no trato dos patrões com os trabalhadores”, define
Alessandro Viana, delegado sindical da entidade. “A CPTM tem um corpo
qualificado. Para entrar na empresa, você tem que prestar concurso. Mas
eles têm cada vez mais recorrido a empresas terceirizadas. A gente
recebe muita reclamação de que elas fazem serviço que tem que ser
refeito pelas nossas equipes.”
PL da terceirização
A
luta contra a terceirização também se dará em Brasília no mesmo dia 14,
quando poderá ser votado na Comissão de Constituição e Justiça da
Câmara projeto de lei do deputado e empresário Sandro Mabel (PMDB-GO)
sobre o tema.
As centrais sindicais se opõem ao
projeto na forma como foi apresentado, pois em vez de aumentar as
garantias dos terceirizados, pode levar a uma precarização ainda maior
desses trabalhadores.
Nesta segunda-feira (12)
ocorre mais uma rodada da mesa quadripartite (trabalhadores,
empresários, parlamentares e governo) para discutir o projeto. A partir
de terça, a CUT inicia vigília no Congresso Nacional para pressionar
deputados a não aprovarem o texto.
Segundo a central, a ideia é levar milhares de trabalhadores a Brasília para ocupar o complexo do Parlamento até quarta-feira.
“A
CUT permanecerá na mesa de negociação para tentar construir um acordo
capaz de regulamentar a terceirização sem que se isso seja sinônimo de
precarização, redução de direitos, de salários e enfraquecimento da
representação sindical. Mas também faremos o enfrentamento colocando
nossos militantes em Brasília para impedir que um texto com uma série de
ataques aos trabalhadores seja votado e aprovado”, diz o presidente
nacional da CUT, Vagner Freitas, em texto publicado no site da central.
Sérgio
Luiz Leite, primeiro secretário geral da Força Sindical, vai na mesma
linha. “Queremos um acordo, mas, para isso, não podem atropelar o
diálogo fazendo votação na quarta-feira”, diz . “Há disposição do
governo e do relator em votar a matéria. Nossa ideia é de continuar
negociando, caso não haja entendimento na segunda-feira. Se ainda assim
eles quiserem votar, vão romper com a mesa quadripartite, que tem
surtido bons efeitos.”
Os sindicalistas querem ao
menos que o projeto garanta aos trabalhadores terceirizados os mesmos
direitos que os funcionários da empresa contratante. “Com a salvaguarda
de a prestadora de serviço ser uma empresa especializada, de haver
representação sindical e alcance dos direitos trabalhistas a todos,
vamos acertar a proposta. Mas os empresários ainda não concordam, nem o
relator.”
Segundo estudo da CUT e do Dieese,
feito em 2011, o trabalhador terceirizado permanece 2,6 anos a menos no
emprego, tem uma jornada semanal de três horas a mais e ganha 27% a
menos que o contratado de forma direta. Além disso, a cada dez acidentes
de trabalho, oito ocorrem entre terceirizados.
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